quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

ESCRAVIDÃO - RESENHA


     Ouço muitas pessoas falarem: “Eu não tenho dívida nenhuma com a escravidão, não estava lá na época”. Em tese, não estávamos, mas tenho minhas dúvidas, já que acredito que tudo está interligado: pessoas – Terra – tempo – espaço. Principalmente, quando sabemos o quanto o povo escravizado sofreu. Creio que algum reparo, que nossos antepassados deveriam ter feito e não fizeram, podemos fazer agora. Um arquiteto baiano foi atrás de sua ascendência africana, em busca de uma resposta. Através de pesquisa de seu DNA, ele descobriu onde vivia seus ancestrais. Ele viajou para uma comunidade no interior de Camarões e indagou ao chefe da tribo por que seus antepassados deixaram que seu povo fosse escravizado e humilhado. Isso é contado por Laurentino Gomes em seu mais novo livro: Escravidão – Volume 1, que explora a história desde o primeiro leilão de escravos, em Portugal, em 1444, até a destruição do Quilombo dos Palmares e consequente morte de Zumbi, em 1695. Para nos brindar com essa obra de arte, Laurentino Gomes foi a vários países e escarafunchou tudo o que pôde para escrever, magistralmente, sobre a história do povo escravizado, que nem sempre foram os negros.
     Mergulhei nas 504 páginas do livro, naquele terrível episódio da história do Brasil e de outros países, sentindo na alma a dor, aflição e sofrimento pelos quais passou o povo escravizado, a maioria vindo da África. O Brasil foi o maior território escravista do Ocidente, com 5 milhões de africanos cativos, dentre os 12,5 milhões embarcados da África para a América. Aliás, o Brasil sempre esteve em destaque em relação à escravidão, foi o último país a acabar com o tráfico e último do continente a libertar os escravos. A capital que mais recebeu escravos? Rio de Janeiro. Durante 3 séculos e meio, a economia brasileira girou em torno da escravidão, com a plantação de cana e depois café e depois com as pedras preciosas. Naquela época, Brasil era açúcar e café e açúcar e café eram escravidão. Por incrível e mais cruel que pareça, o tráfico de escravos foi um elemento determinante na formação do país. Além disso, O Brasil é citado mais uma vez através do mais famoso e mais rico mercador de escravos da Costa africana: Francisco Félix de Souza, nascido em Salvador, tendo se mudado ainda jovem para a África.

     O tratamento e as condições que eram impostos aos escravizados eram abomináveis. 45% deles morriam no trajeto África ao Continente Americano. De 100 capturados, 40 sobreviviam no final da jornada. Eram transportados em ambientes insalubres, fétidos, em meio a fezes e ratos, mal alimentados, tratados como cargas, como animais.
     Certa vez, em discussão no meio político, alguém do novo governo alegou que o Brasil não foi à África retirar o povo de lá, que foram os próprios africanos que escravizaram seu povo. Mas essa alegação não passa de uma má interpretação da história. O livro Escravidão cita que tribos africanas vendiam seu próprio povo para sobreviver economicamente. Mas, quem explorou a mão-de-obra escrava, humilhou e agrediu foram os países europeu e americano. E acredito que esse carma pesa até os dias atuais, como um fardo que teremos que carregar por toda a história e expiar em algum momento de nossa vida. Parece bobagem, mas basta observar algumas pessoas que espelham em sua personalidade características escravistas, que com truculência, impõem autoridade sobre os demais, que muitas vezes, não conseguem ou não encontram condições para se defenderem.

Por: Denise Constantino da Fonseca

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