quarta-feira, 24 de agosto de 2016

QUANDO COMEÇARAM A ME CHAMAR DE SENHORA...

Quando começaram a me chamar de senhora, assustei-me. Não me senti eu mesma. Era outra. Alguém a quem não conhecia e não queria conhecer. Quando cheguei a minha casa, a primeira atitude que tive foi olhar-me através do espelho e como uma cientista detalhista, examinei cada recanto de minha face para comprovar a mim mesma se merecia ser chamada de senhora. Sabem? Não descobri muitas rugas, ou então estou sendo condescendente comigo mesma, porém, uma fenda em volta da boca, o cansaço em volta dos olhos junto às marcas de anos de uso de óculos e alguns fios de cabelo branco me acusaram. Mesmo assim, perscrutei-me se somente esses contratempos faziam-me ser chamada de senhora. Então, iniciou-se uma luta entre o meu eu contra o meu outro eu. É claro que chegaria um dia em que eu teria que me entender com o espelho e com a palavra “senhora”, afinal, já estou com 53, apesar de que os números não fazem jus a minha aparência. Ora, não existe “senhora” como pronome pessoal. Segundo o Dicionário on-line de português, “senhora” significa “Tratamento cortês, dispensado a uma mulher casada e, em geral, a qualquer mulher de certa condição social”. Mas... Então por que estão me chamando de senhora? Não sou nenhuma celebridade, nem casada, minha condição social é discreta...  Sou apenas eu, e o pronome usado para uma pessoa se dirigir a mim, seria o pronome pessoal de terceira pessoa: você.  Que loucura! Eu não quero ser uma senhora só porque tenho uns fios brancos e algumas rugas ainda superficiais. As pessoas insistem em usar o tratamento “senhora” para quem já chegou nos “enta” (quarenta, cinquenta...). Tá, não sou mais uma menina, não sou jovem, e que eu não me iluda porque há mulheres que têm menos números que eu e aparentam ser muito mais senhoras; que eu não me iluda porque as pessoas dizem que eu não aparento ter a idade que tenho. Melhor aceitar que dói menos? Não, não sou de me conformar. Minha sobrinha mais velha já tem 25. Duas sobrinhas-netas. Prefiro ficar no aconchego de minha casa a sair para baladas. Praia, só depois das 3. Prefiro pousada a acampamento... Algumas dores na coluna, nas articulações... Aderi ao RPG e fisioterapia. Para a arte, sinto-me mais madura e mais seletiva e já não tenho mais paciência para assistir a tudo que chamam de arte. E falta de paciência é também sinal de velhice? A idiotice das pessoas me cansa. Cansam-me também a ignorância e a falta de vontade de aprender. Estou realmente ficando senhora? Estou sendo derrotada pelas evidências? Maturidade é um dos sinônimos para velhice? Estou me condenando cada vez mais. Os problemas de saúde me rondam, mas meu corpo é forte, no final, tudo não passa de alarmes falsos. O colesterol é meu Calcanhar de Aquiles, já não posso comer tudo que me dá prazer. Hoje em dia me vejo em roda de conversa com outras senhoras, discutindo taxas de glicose, colesterol, crises de gastrite, etc. Coisa que nunca imaginei participar; é como estar em um grupo de mães, esposas e donas de casa discutindo seus afazeres. Mas não me rendo.  Afinal, não está me faltando fôlego. Antigamente, corria menos que corro hoje. Nunca havia participado de competições, coisa que hoje faço com constância e prazer. Além de correr, também faço trilha. Tentando afastar a velhice. Senhora? Dizem que sorriso rejuvenesce. Então estou sorrindo mais. Não desisto de não permitir que a “senhora” me abduza, nem de não me resignar com a velhice chegando. Posso vigiar minha alimentação, expulsar a preguiça e sorrir, e assim envelhecerei dignamente. O fato é que exibo externamente uma idade de senhora e um físico saudável e firme, e uma alma jovem que ainda habita em mim e que não é compatível com a quantidade de anos que já vivi. Porque não é a aparência física que conta, mas sim a energia fundamental, que vem da alma e que nos mantém ativos, vivos, joviais, e que reflete no corpo. Então, vocês aí, não precisam me chamar de “senhora”, não é cabível ao meu estado de espírito. 


Por Denise Constantino

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